Por Carlos Branco
João Gomes (JG) que se apresenta como
conselheiro sénior do grupo parlamentar da Iniciativa Liberal (IL) publicou na
sua conta do “X” um texto onde fez afirmações de extrema gravidade. Pondo de
lado os ataques pessoais, acusou-me de ser “um cancro no debate público, e
quanto mais cedo sair da televisão nacional, melhor será para a informação,
para o país e para a dignidade dos verdadeiros especialistas”. Segundo ele, eu
deveria ser irradiado do espaço mediático.
E acrescentou, “o jornalismo sério deve
filtrar as vozes que merecem ser ouvidas e eliminar os charlatões,” “o problema
reside na irresponsabilidade dos media em continuar a dar-lhes palco.” De lápis
azul na mão, JG é que sabe quem deve ser selecionado como analista, porque ele
é que é sério, ele é que percebe aquilo que é bom para o povo. Pensar de modo
diferente é delito de opinião.
Se a voz de JG chegasse ao céu, Friedrich
Hayek, a grande referência ideológica do partido em que milita, estaria a corar
de vergonha, por um seguidor seu defender a censura e mandar calar a opinião
discordante.
Seria (hipoteticamente) impensável, quando nos
preparamos para comemorar os cinquenta anos da Constituição da República
portuguesa, defrontarmo-nos com um funcionário de um partido com representação
parlamentar, pelos vistos desconhecedor da sua matriz ideológica, a apelar
publicamente e sem qualquer pudor à censura e ao silenciamento de vozes que não
são do seu agrado, manchando a reputação democrática do seu partido.
JG faz tábua rasa dos valores liberais, dos
direitos individuais e da liberdade de pensamento e de expressão. A defesa do
“cancelamento” assume maior gravidade quando JG não é a única voz a achar serem
estas tiradas aceitáveis. O debate ideológico desapareceu, sumiu-se, e foi
substituído pelo comportamento típico das claques de futebol, turbas reunidas
em redor de pulsões identitárias questionáveis.
Ao não ser repudiada e tornar-se banal, esta
anormalidade começa a assumir contornos alarmantes. Uma nuvem negra adensa-se
sobre a democracia portuguesa, criando um ambiente pestilento. Parece que o
combate que se avizinha já não será o de a aprofundar, mas apenas o de a manter
viva.
Debates sobre temas como a liberdade de
expressão, que se julgavam extintos, por serem desnecessários, afinal não
estão. É profundamente preocupante que um militante de um partido democrático
defensor dos valores liberais e que reclama o direito de descer a avenida da
liberdade no dia 25 de abril, tenha a ousadia e a falta de discernimento de
defender estas ideias. Sabemos que no melhor pano cai a nódoa e que JG
certamente está no partido errado.
O drama que envolve estas anormalidades parece
não se restringir a Portugal. Na Europa pairam movimentos semelhantes, onde se
cancelam eleições e se impedem candidatos de concorrer, apenas porque pensam de
modo diferente do main stream. A matriz dos que pensam como JG levar-nos-á,
cada vez mais, a um beco onde a saída será a perda daquilo que até aqui tinha
sido dado como adquirido.
É muito preocupante a trivialização da
anormalidade. Eu não tinha idade para participar nas ações que conduziram ao
“dia inteiro e limpo, onde emergimos da noite e do silêncio”, como cantou a
poetisa, mas não hesito em afirmar que se a tivesse lá teria estado. Por isso,
não posso permitir que ideias retrógradas e fascizantes desta
índole, que devem ser condenadas, possam
prevalecer na nossa sociedade. A Inquisição ainda está presente entre nós, com
muitos candidatos a juízes do Santo Ofício. Algo errado aconteceu.
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