Depois do primeiro-ministro Costa ter lançado a requisição civil sobre os estivadores do Porto de Lisboa com a alegação de não estarem a cumprir os serviços mínimos, que muito justamente lutavam pelo pagamento de salários em atraso e contra o lock out dos patrões do sector e, aliás, tendo respeitado sempre os tais serviços mínimos, o monárquico PR Marcelo, depois de auscultar o seu conselho de senadores do regime, decretou o estado de emergência na República: a democracia está suspensa a partir de hoje até quando for preciso. A seguir à deriva austeritária, que o Governo do PS manteve em lume brando, vem agora a deriva autoritária, tão ansiada pelos partidos de direita e pelo próprio Marcelo. Como temos vindo a afirmar é a social-democracia que traz pendurado nas costas o fascismo quando a crise capitalista não se resolve rapidamente; a pandemia do coronavírus foi somente o pretexto. E como também já tínhamos denunciado, mal o Marcelo foi eleito PR, que ele iria ter um papel um pouco semelhante ao do seu padrinho, mas em sinal contrário: Caetano marcou o fim do fascismo, porque a isso foi obrigado, Marcelo, de livre e espontânea vontade, marcará o fim da democracia parlamentar burguesa saída do 25 de Abril. Esta é a primeira declaração, e imposição, do estado de emergência depois da dita “Revolução dos Cravos”, daqui para frente nada será como dantes, e parece que este regime durou menos que o fascismo, graças a todos os partidos com assento no Parlamento, também ele suspenso (reunirá 1 vez por semana e com apenas 20% dos deputados).
Dizia o poeta e dramaturgo que um burguês
assustado é um fascista, Marcelo e Costa são dois burgueses assustados, com o
primeiro refugiado em casa por duas semanas, tendo feito uma intervenção
verdadeiramente patética por vídeo que mais parecia estar no bunker com medo de
algum bombardeamento; e não havendo solução à vista para a crise sistémica do
capitalismo nacional, é natural o medo da bancarrota e que o povo se revolte.
Este período de quarentena forçada do povo português, que seria em princípio
para prevenir algum alarme social, irá ter efeito contrário ao anunciado e, por
outro lado, irá aumentar a pobreza e as desigualdades sociais e económicas
entre os portugueses, com muita gente pobre a ter ainda mais dificuldades em
aceder aos meios essenciais de sobrevivência e com milhares de trabalhadores a
passarem a receber apenas dois terços do salários e outros, os a recibo verde,
a receber um terço, de salários já de si bastante baixos e insuficientes para
se poder levar uma vida minimamente digna.
O Costa poderá dizer o que quiser a respeito
de não haver despedimentos por força do Covid-19, que até parece vir de
propósito para justificar mais medidas de austeridade e de repressão sobre os
trabalhadores, porque mais despedimentos irão acontecer forçosamente, nem que
seja pela diminuição do consumo, com alguns já previstos há algum tempo,
denunciando que a causa está para além da pandemia, sendo bem ilustrativo o
exemplo da fábrica da alemã Continental, em Palmela há 25 anos, que irá encerrar
até o final de 2021, quase de certeza que será antes, e lançar no despedimento
370 trabalhadores, ou a própria Autoeuropa, que foi das primeiras empresas a
suspender a produção, que não irá ficar com o mesmo número de trabalhadores já
que a crise irá fazer diminuir a procura de automóveis. Segundo estimativa da
OIT (Organização Internacional do Trabalho) este surto do novo coronavírus pode
levar à destruição de 25 milhões de empregos em todo o mundo e resultar numa
perda de 3,4 mil milhões de rendimento para os trabalhadores.
Por força do estado de emergência, o Governo
PS/Costa pode exercer todo o poder discricionário e ditatorial sobre os
trabalhadores, não com certeza sobre os grandes grupos económicos e grandes
capitalistas, são proibidas as greves, as reuniões e as manifestações, e
trabalhadores que não respeitarem as indicações das autoridades incorrem em
penas que poderão ir até 1 ano de prisão ou multa até 120 dias e os dirigentes
dessas greves ou manifestações incorrerão no dobro das penas (artigo 304.º do
Código Penal). Claro que esta criminalização é para ser feita contra o mundo do
trabalho e não do capital, o povo e os trabalhadores é que são o verdadeiro
alvo. O direito à greve está suspenso, tendo a CGTP suspendido as greves e
manifestações ainda antes da declaração do estado de emergência, numa
colaboração mais que suspeita, e é imposta a obrigatoriedade de qualquer
trabalhador, não só do sector da saúde ou de prestação de socorro, de ir
trabalhar em outro local, em outro tipo de actividade ou horário a critério da
entidade patronal (nos hospitais do SNS já se prepara a aplicação do horário
das 12 horas, exemplo, Hospitais da Universidade de Coimbra, e a empresa
Hutchinson Borrachas, em Portalegre, decidiu obrigar os trabalhadores a laborar
cinco horas seguidas sem poderem comer), e com salário reduzido, sem poder
protestar ou reivindicar ou que quer que seja. São os direitos, garantias e
liberdades do indivíduo que estão a ser coartados, mas principalmente do
trabalhador assalariado, a requisição civil está a ser feita sobre a força do
trabalho assalariado e não sobre o património ou a pessoa do capitalista, ainda
estamos para ver a requisição dos hospitais privados, respectivo pessoal e
equipamentos.
À pala do combate ao coronavírus, o Governo
PS/Costa irá endurecer as medidas de controlo e, caso seja necessário, de
repressão sobre os trabalhadores. Em relação ao controlo, as polícias
portuguesas, assim como as da União, estão a preparar mecanismos de controlo
facial, tal como já se faz na China social-fascista, tão criticada pelos órgãos
de informação corporativos, e, ninguém se admira, que daqui a alguns dias
alguém se lembre em instituir o que o governo israelita acaba de fazer:
controlar os telemóveis para, alegadamente, combater o coronavírus, seguindo os
movimentos das pessoas infectadas e localizar e alertar aquelas pessoas que
estiverem próximas, o que permite criar uma base de dados, que o governo
promete destruir logo que passada a pandemia; medida que foi de imediato
contestada pela Association for Civil Rights in Israel e outros
defensores dos direitos e liberdades dos cidadãos. Foi também com o pretexto da
atacar e conter a pandemia que o governo de Macron proibiu as manifestações dos
“coletes amarelos” que teimavam em eternizar-se e o ditador eleito Piñera, no
Chile, decretou o Estado de Excepção Constitucional de Catástrofe por 90 dias e
colocou a tropa na rua para travar as manifestações do povo revoltado e que
ainda persistem, por sinal, no mesmo dia em que o Marcelo decretou o Estado de
Emergência Nacional em Portugal. Depois de lançarem o pânico entre povo, eles
ainda mais assustados, todos os reaccionários do mundo se unem.
A própria sobrevivência da União Europeia
encontra-se em jogo, ela corre o risco de afundar-se a breve prazo. A saída da
Grã-Bretanha, a estagnação económica da Alemanha e da França, forte
endividamento da terceira economia da UE, a Itália, a falta de solidariedade
dos países mais ricos em relação aos mais pobres e periféricos (a Alemanha
proibiu a exportação de equipamento médico para combate ao vírus), o aumento de
endividamento destes último países por força do esforço económico que agora
será feito e por força da subida das taxas de juro sobre as dívidas soberanas
que já se está a fazer sentir (em 4 dias a taxa de juro da dívida pública
portuguesa a 10 anos subiu de 0,791% para 1,208%, em Fevereiro estava abaixo
dos 0,3%, e a subida de 1% representará mais 3 mil milhões de euros) são
factores endógenos e exponenciais que precipitarão o fim. Lagrade, presidente
do BCE (Banco Central Europeu), foi clara, apesar de logo tentar emendar a mão,
a boca fugiu-lhe irresistivelmente para a verdade: não é da competência do BCE
reduzir os spreads da dívida pública na zona euro. Estamos ainda bem lembrados
de outras palavras da mesma senhora quando era presidente da instituição
benemérita FMI de que os idosos eram um peso para a economia; ora, são
exactamente os idosos que estão a ser as principais vítimas do coronavírus
(veja-se o que se está a passar em Espanha!). O dinheiro prometido para
“estimular” a economia é para dar aos bancos que, por sua vez, irão continuar a
lucrar com a dívida pública, Portugal já passou mais de 25 mil milhões da
dívida pública externa para a banca dita "nacional", só entre 2015 e
2019, com o governo de Costa/Centeno, tendo atingido a dívida do Estado à banca
o montante de 83.888 milhões de euros no fim de 2019.
O dinheiro prometido às empresas e patrões,
3000 milhões de garantia aos créditos, para isso ainda teve que pedir
autorização a Bruxelas, 5200 milhões na área fiscal e 1000 milhões na área
contributiva, no total de 9200 milhões, são uma panaceia de que irão beneficiar
apenas as grandes empresas, as pequenas irão ser condenadas à falência, e os
trabalhadores nada receberão, apesar do Governo Costa/PS não se cansar de dizer
que é dinheiro para ajudar as “famílias”, as famiglias serão outras, com
certeza. O que se verificará na prática é que Portugal sairá mais endividado
desta crise económica, destapada e de certo agravada pelo surto do Covid-19,
mas já existente e que a todo o momento prometia rebentar, crise aguda dentro
de crise crónica do capitalismo. E esta até seria, já que estamos em estado de
emergência, uma excelente oportunidade para o Governo PS/Costa, caso tivesse
tomates para tal, alterar alguma coisa na economia, como seja: desenvolver a
produção por parte do Estado, e o Laboratório Militar até tem capacidade para
tal, de medicamentos e desinfectantes, que estão a ser objecto de especulação
verdadeiramente escandalosa; de equipamento de protecção; e de outros bens
essenciais em situação de calamidade e de emergência; e nacionalizar todas as
empresas, a começar pelos bancos, que entendesse para o bem do povo, o dito
“interesse público”.
O Governo Costa/PS pode suspender, caso queira,
o pagamento da dívida soberana até que dure a crise pandémica e se realize uma
auditoria cidadã à dívida que, toda ela ou quase, é ilegítima, ilegal e odiosa,
porque não foi o povo que a contraiu nem dela beneficiou ou beneficia.
Suspensão imediata do pagamento da dívida para que o dinheiro que tem sido
gasto com ela, mais de 8 mil milhões por ano em média, seja todo aplicado no
fortalecimento do SNS e, no imediato, na aquisição de bens e contratação de
pessoal para o combate ao coronavírus. Aqui os partidos que se dizem de
esquerda com assento parlamentar teriam uma palavra importante a dizer. Mas,
infelizmente, nada disto acontecerá, porque temos um governo e partidos, que se
arvoram do “comunismo” e de “esquerda”, e que estão completamente de acordo, e
mais do que isso, integrados de alma e coração no salvamento da economia
capitalista periclitante. Terão de ser os trabalhadores e o povo, um dia
destes, a sair para a rua e exigir o que tem de ser exigido, nem que seja pela
força das circunstâncias: o povo não se deixará matar nem pela fome nem pelo coronavírus.
19 de Março 2020
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