No final de Outubro de 2005, no subúrbio parisiense de Clichy-sous-Bois, dois jovens descendentes de imigrantes, Zyed Benna (17 anos) e Bouna Traoré (15 anos), morreram electrocutados quando fugiam da polícia.
Longe de ser um incidente isolado, este
acontecimento desencadeou um conflito social que, durante três semanas,
transformou os bairros das cidades francesas num campo de batalha. O que
começou como um protesto localizado rapidamente se espalhou por 274 municípios,
deixando 9.000 veículos incendiados, 200 milhões de euros em danos materiais e
uma profunda ferida na sociedade francesa.
As raízes desta explosão social residiam nas
condições de vida dos bairros, bairros sociais periféricos que, desde as
décadas de 1970 e 1980, se tinham tornado jaulas para as populações imigrantes,
sobretudo magrebinas e subsaarianas.
O desemprego jovem nestes bairros atingiu
níveis críticos, enquanto a discriminação sistemática no emprego e na habitação
perpetuava um ciclo vicioso de exclusão social. A presença policial, longe de
garantir a segurança, tornou-se uma fonte constante de tensão, com verificações
de identidade arbitrárias e episódios de brutalidade a alimentar o
ressentimento acumulado ao longo de gerações.
A violência manifestou-se através de métodos
característicos dos tumultos urbanos modernos: incêndio de veículos como forma
de protesto simbólico, ataques a edifícios públicos e confrontos com a polícia.
A resposta do governo de Jacques Chirac,
liderado pelo então Ministro do Interior Nicolas Sarkozy, foi a implementação
de uma política de “tolerância zero” e a declaração do estado de emergência a 8
de Novembro.
O discurso oficial, em particular as
declarações de Sarkozy a apelidar os jovens de "escória", apenas
agravou as tensões e revelou a profunda ignorância política em relação à
realidade dos bairros degradados urbanos.
Agora que Sarkozy está na prisão, é possível
identificar quem são os verdadeiros escroques destas sociedades europeias,
podres até à medula.
O legado dos tumultos transcendeu o imediato.
As imagens de bairros em chamas tornaram-se um símbolo da fractura social de
França, enquanto o debate sobre a integração, a identidade nacional e o modelo
republicano adquiriu uma urgência política sem precedentes.
Embora as chamas tenham sido extintas ao fim
de três semanas, as tensões sociais persistiram, como evidenciado pelos
distúrbios subsequentes em 2006 e 2007. A França descobriu em 2005 que os
incêndios nos subúrbios não eram simplesmente um problema de ordem pública, mas
um sintoma de uma crise estrutural que marcou o fim da Quinta República.

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