Marcelo, após as várias trapalhadas que criou, regozija com a apresentação do
pedido de demissão de Costa, devido a suspeição de estar envolvido em corrupção
ligada aos negócios da “transição energética”, um dos objectivos e razões da
dita, preparando-se para a dissolução da Assembleia da República e convocação
de eleições antecipadas. Não foi em Maio com o caso “Galamba”, foi agora e a
iniciativa partiu de Costa. Marcelo poderá igualmente agradecer à Procuradoria
Geral da República que se assume como instrumento na luta política. Quase de
certeza que terá tido uma convulsão fisiológica.
O deflagrar da denominada “bomba atómica” irá
fazer esquecer, pelo menos durante algum tempo, as boutades de Marcelo, que
estão longe de ser uns meros descuidos ou gafes, mas as expressões da sua
verdadeira natureza de democrata reciclado depois de 25 de Abril. A sua
formação cultural de filho da oligarquia fascista vem periodicamente ao decimo
quando o controlo abranda, ou por estar bem-disposto após lauta refeição bem
regada ou por se sentir mais seguro, contando com a condescendência dos media
mainstream e das massas mais ingénuas. Nos últimos tempos, e para citar apenas
alguns episódios, o monárquico PR, uma contradição nos termos, quebrou o fino
verniz que cobre o seu real carácter.
Começou com a desculpabilização do número de
vítimas do clero católico pedófilo, encobrindo o seu amigalhaço bispo e
avisando-o de que estaria a ser investigado pela justiça; depois, veio tentar
esclarecer o que disse, operação que repete sempre quando a boca atira para o
disparate. A seguir, se bem nos lembramos, veio a observação aparentemente
brejeira sobre o decote que deixava antever o volume das mamas de uma jovem
emigrante, parece que jamais terá visto coisa semelhante; desculpou-se então
com o frio que se fazia sentir. Mais recentemente, foi a abordagem paternalista
e a despropósito, na medida que não é assunto do seu ofício, ao embaixador do
estado palestiniano em Portugal sobre os responsáveis pelo actual conflito no
Médio Oriente; perante as reacções, sentiu a necessidade de vir por duas vezes
esclarecer o vómito presidencial. Declaradamente, não possui controlo de
impulso, será distúrbio de personalidade para o qual não há tratamento?
Mas continuando, e, last but not least, espécie
de cereja em cima do bolo, é apontado como suspeito de ter metido cunha para o
tratamento de duas crianças brasileiras com medicamento milionário no SNS.
Resumindo, e considerando apenas estas metidas da pata na poça, Marcelo revela
uma mentalidade arrogante, de os meios justificam os fins e os nossos estão
primeiro, nepotismo à última exponencia, paternalista e colonialista,
patriarcal e sexista, pese o seu fácies de peru velho, monárquico e beato, e,
acima de tudo, um político populista e hipócrita – decididamente, um
reaccionário. O que é natural, está-lhe nos genes; mesmo que troque de género,
através de umas cirurgias plásticas, o sexo será sempre o mesmo porque os genes
não mudam.
O presidente beato de sacristia, que é levado
ao colo pelos órgãos de propaganda do regime e que agora devem delirar com a
atitude de dissolução do Parlamento e de convocação de eleições antecipadas, é
apresentado por estes laxantes cerebrais como seja ele o responsável pela
actividade do governo, à semelhança de regime presidencialista, uma espécie de
regente de orquestra, que não é, e que poderá, um dia destes, o feitiço
virar-se contra o feiticeiro; ou seja, ter um fim triste. Já aqui o dissemos,
Marcelo ficará na história como o presidente da república ligado, e até certo
ponto corresponsável, à degradação do regime democrático saído do golpe de
estado de 25 de Abril de 1974, e que daqui a pouco mais de cinco meses
completará cinquenta anos – à semelhança, pelo menos formal, do padrinho
Caetano que foi o último primeiro-ministro (então presidente do conselho) do
fascismo luso.
Será bom recordar que Marcelo foi reconduzido
em 2021 com mais votos do que em 2016, teve mais votos do que todos os outros
candidatos e obteve o seu maior apoio no seio da classe média que ama sobretudo
a paz social e predominante no interior do país. Marcelo, logo que se soube dos
resultados recebeu os maiores encómios da imprensa mainstream: “Portugal
desafia a pandemia e reelege Marcelo Rebelo de Sousa como Presidente”,
lembremo-nos que o homenzinho declarara que se candidatava porque havia a
pandemia, presumindo-se que caso o não fizesse seria uma cobardia; “Marcelo
liderou onde há mais casos covid-19 e maior área ardida”, parecia que era a
esperança do povo para a cura da doença e para a regeneração florestal do
país!; “Marcelo quer unir" e “venceu em todos os 308 concelhos do país”,
será o chefe da “união nacional”. No entanto, somente 23,48% dos eleitores
votaram nele, o que não impediu que tivesse sido apresentado como o Salvador da
Pátria. E será este salvador que irá ajudar a enterrar a democracia de Abril, e
vontade não lhe falta.
É curioso notar que a qualidade dos
presidentes da república eleitos que temos tido desde o 25 de Abril tem vindo
gradual e imparavelmente a diminuir desde o primeiro. O general Ramalho Eanes,
o único que soube dignificar o cargo, talvez por ser militar, não sabemos, e
que, como figura política, sempre se deu ao respeito. A partir daí, tem sido o
descalabro, desde uma figura demagógica e poltrona, passando por um político
frouxo e outro empedernidamente reaccionário, até ao actual, de carácter
dúplice, intriguista e perigoso, e que poderá gabar-se de ter sido o único, se
a memória não nos atraiçoa, de ter concitado contra si uma manifestação
popular. Ficará na história pela triste figura de ter degradado o papel e a
imagem do mais elevado magistrado da nação, rebaixando-os aos de qualquer soba
de reino das bananas. O que, diga-se de passagem, não é de estranhar já que
reflecte o ponto a que chegou esta democracia de ópera bufa. Marcelo, mistura
de duquesa de Mântua e de Sidónio, será o símbolo do apodrecimento do regime e
a nostalgia do Portugal salazarento que ressuscita na sua pessoa.
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